Israel: Supremo derruba reforma judicial de Netanyahu e reacende divisões domésticas em plena guerra
O Supremo Tribunal de Israel derrubou nesta segunda-feira (01/01) a reforma judicial que o primeiro-ministro do país, Benjamin Netanyahu, vinha tentando promover – decisão que deixa o governo sob pressão ainda maior num momento em que o país trava uma guerra contra o Hamas.
A reforma judicial de Netanyahu – que causou em 2023 uma onda de protestos, inclusive nas forças armadas, levou à demissão do ministro da Defesa e fez militares enviarem cartas abertas ameaçando parar seu serviço – buscava limitar o poder do Supremo e dar ao governo maior influência na nomeação de juízes.
A decisão do Supremo Tribunal de anular a reforma aprovada no Parlamento ocorre após meses de turbulência interna e enquanto Israel trava uma guerra na Faixa de Gaza após sofrer ataques do Hamas que deixaram 1,4 mil mortos em 7 de outubro.
Desde então, cerca de 22 mil palestinos – em sua maioria mulheres e crianças – morreram em Gaza nos ataques israelenses, segundo o ministério de Saúde local, ligado ao Hamas.
Uma análise publicada no jornal The New York Times, dos EUA, diz que a decisão do Supremo israelense coloca o país numa rota de “crise constitucional”.
Segundo o jornal, a decisão “anuncia um potencial confronto entre a autoridade judicial superior e a coligação no poder, e poderá remodelar fundamentalmente a democracia israelense, colocando o poder do governo contra o do tribunal”.
A decisão reverberou no mundo político israelense.
O ministro da Justiça de Israel, Yariv Levin, disse que os juízes do Supremo assumiram todos os poderes “que numa democracia estão divididos entre os três ramos do governo”.
Principal arquiteto da reforma judicial, Levin disse ainda que a decisão “não nos deterá”. Ele afirmou, no entanto, que o governo “continuará a agir com moderação e responsabilidade” durante a guerra.
Outros membros do governo disseram esperar que a decisão do Supremo não abale a unidade nacional num momento em que as tropas israelenses combatem em Gaza.
Para o ministro da Cultura e Esportes, Miki Zohar, “teria sido melhor que esta decisão tivesse sido divulgada depois destes dias difíceis, nem que fosse apenas para evitar o regresso do discurso divisionista”.
O partido Likud, de Netanyahu, disse que “a decisão do tribunal contradiz o desejo de unidade do povo, especialmente em tempos de guerra.”
Já a oposição festejou o anúncio do Supremo.
O líder da oposição, Yair Lapid, disse que a decisão “põe fim a um ano difícil de conflito que nos separou por dentro e levou ao pior desastre da nossa história”.
Ele diz que “a fonte do poder de Israel, a base da força israelense, é o fato de sermos um Estado judeu, democrático, liberal e cumpridor da lei”.
O Movimento para um Governo de Qualidade em Israel, um dos principais grupos contrário à reforma de Netanyahu, também elogiou o “veredito histórico” e disse que a decisão foi “uma tremenda vitória pública para aqueles que buscam a democracia”.
“Um governo e ministros que procuraram se isentar do Estado de Direito foram informados de que há juízes em Jerusalém; que existe democracia; que há uma separação de poderes”, afirmou o movimento.
O governo de Netanyahu é visto como o mais direitista da história de Israel e enfrenta uma forte oposição no país.
Em julho, o governo aprovou em lei o que hoje é conhecido como projeto de lei da “razoabilidade”.
A lei retirou o poder do Supremo Tribunal e dos tribunais inferiores em Israel de cancelar decisões governamentais consideradas “extremamente irracionais”.
Na época, a lei causou protestos generalizados. Centenas de milhares de manifestantes saíram às ruas pedindo o cancelamento da reforma e a queda do primeiro-ministro.
Centenas de reservistas militares – incluindo pilotos da Força Aérea – ameaçaram se recusar a se apresentar para serviço, o que, segundo o governo, poderia prejudicar as capacidades militares de Israel.
A decisão do Supremo é mais um revés para Netanyahu, que já enfrentava críticas em Israel por não ter evitado o ataque do Hamas em 7 de outubro e por até agora não ter conseguido resgatar todos os reféns israelenses levados para Gaza.