Dólar dispara de R$ 5 a R$ 5,26 em sete dias; entenda os motivos
Valorização da moeda norte-americana frente ao real está relacionada ao acirramento dos conflitos no Oriente Médio, da piora de expectativa por uma queda de juros nos Estados Unidos e pelo afrouxamento da meta fiscal para controle das contas públicas do país. Notas de dólar
Karolina Grabowska
Nos últimos sete dias, o dólar disparou frente ao real. A moeda norte-americana saltou de R$ 5 para R$ 5,26 em apenas sete dias. Com o resultado do pregão desta terça-feira (16), a moeda americana acumula alta de 5,25% nesse curto período.
O dólar não só atingiu como renovou seu maior patamar em mais de um ano, acendendo um alerta para o governo brasileiro e sua equipe econômica.
Em 2023, a moeda norte-americana havia acumulado uma queda de 8,06% no primeiro ano da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Foi um fator importante para o controle da inflação e o consequente início do ciclo de corte de juros.
No início de 2024, o caminho se inverteu. Até aqui, o dólar passou a acumular ganhos de 8,60% sobre o real — impulsionado, em especial, pelas altas desta semana.
Nesta reportagem, o g1 responde o que está provocando o avanço tão severo do dólar. Três fatores ajudam a explicar a desvalorização da moeda brasileira nesta semana.
São eles:
Piora nas expectativas sobre cortes na taxa de juros dos Estados Unidos
Escalada dos conflitos entre Irã e Israel
Mudança na meta fiscal anunciada pelo governo
Expectativa sobre os juros nos EUA
Em sua última reunião, no dia 20 de março, o Fed (Federal Reserve, o Banco Central dos EUA) decidiu manter os juros do país na faixa de 5,25% a 5,50% ao ano. Essa foi a quinta reunião consecutiva sem alteração no referencial dos juros norte-americanos.
A decisão já era esperada pelo mercado. A expectativa, portanto, ficou em torno dos recados do colegiado quanto ao futuro dos juros.
Em entrevista a jornalistas logo após o anúncio da decisão, o presidente do Fed, Jerome Powell, chegou a afirmar que o aperto monetário pode ter atingido seu pico. “Os números realmente não mudaram a história geral, que é a de uma inflação caindo gradualmente”, afirmou.
Além disso, na interpretação dos agentes do mercado financeiro, tanto o comunicado do Fomc quanto as projeções do colegiado vieram em um tom mais positivo do que o esperado — ou seja, em direção a cortes, mesmo que menores, dos juros do país.
Queda de juros nos EUA ajudam a valorizar o real frente ao dólar. Quando os juros estão elevados por lá, a rentabilidade das Treasuries (títulos públicos norte-americanos), os mais seguros do mundo, é maior. Assim, quem busca segurança e boa remuneração prioriza o investimento nos EUA.
Esse movimento faz o dólar se valorizar. Em relação a moedas emergentes, como o real, o movimento fica ainda mais claro, porque investidores deixam as aplicações mais arriscadas para destinar recursos aos EUA. Quanto menos dólar entra no mercado brasileiro, mais a moeda norte-americana se valoriza.
Após a última decisão do Fed, foram divulgados novos dados da economia norte-americana, que indicaram um mercado de trabalho aquecido e aceleração da inflação no país — dados importantes e que deixam o BC dos EUA receoso de cortar os juros do país.
Com expectativas mais distantes de corte nos juros, a tendência é de valorização da moeda norte-americana.
Na semana passada, no dia 10, houve a divulgação do índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) dos Estados Unidos. Contra as expectativas do mercado financeiro, a inflação ao consumidor acelerou e chegou a 3,5% em março, contra 3,2% registrados em fevereiro e acima das expectativas de mercado.
Após a divulgação da inflação ao consumidor norte-americana, a maioria das bolsas pelo mundo fechou no vermelho. As três principais bolsas de valores de Wall Street fecharam em queda, assim como alguns índices acionários na Europa.
Aqui, o dólar passou dos R$ 5,0070 para R$ 5,0774, alta de 1,41% no dia. Mais números de inflação ao produtor, divulgados ainda na semana passada, levaram a moeda americana a R$ 5,1212 na sexta-feira.
Escalada dos conflitos entre Irã e Israel
No fim de semana, um novo capítulo complicou a situação. O Irã lançou um ataque de mísseis e drones contra Israel, após um suposto ataque israelense contra a embaixada iraniana na Síria.
Desde então, o mundo está observado a possibilidade de que Israel possa revidar um ataque realizado pelo Irã no último fim de semana. Caso isso aconteça, os conflitos podem se agravar no Oriente Médio — região que já tem sido paco dos embates sangrentos entre Israel e o grupo terrorista Hamas.
O aumento dos conflitos também significa uma fuga para o dólar, em um processo que valoriza a moeda norte americana e desvaloriza as moedas emergentes. A primeira reação do mercado veio cedo: o dólar disparou na segunda-feira, chegando à casa dos R$ 5,18.
“Queira ou não, dólar é proteção. É proteção no mundo inteiro. Então, na sexta-feira (12), quando aconteceram os ataques, o mundo inteiro correu para o dólar”, explicou o analista de investimentos Vitor Mizara, na segunda-feira (15), após o início dos conflitos.
Comandante do Exército de Israel diz que ataque do Irã vai ter resposta
A região também é importante produtora de petróleo, o que afeta a cotação da commodity no mercado internacional. E uma alta do petróleo é uma preocupação primordial por aqui porque acrescenta pressão à política de preços da Petrobras.
Um aumento do preço do petróleo deveria afetar diretamente os valores de combustíveis no Brasil, mas a empresa tem segurado os reajustes desde a mudança da política de preços em maio do ano passado.
Mudanças na meta fiscal
Míriam sobre meta fiscal: ‘Se busca neste mandato um equilíbrio das contas públicas’
O último elemento para a disparada do dólar nos últimos dias foi a mudança na projeção fiscal do país, anunciada nesta segunda-feira (15) pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. A nova projeção é de déficit zero para 2025 — e não mais de superávit de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), como previsto até o ano passado.
▶️ Para entender melhor:
Superávit é quando o governo consegue gastar menos do que arrecada com impostos e guarda dinheiro para pagar a dívida pública.
Déficit é o contrário: quando o governo gasta mais do que arrecada, e as contas ficam no vermelho, com aumento da dívida pública.
Conforme apuração do blog do Valdo Cruz, essa mudança na meta significa abrir mais espaço para gastos, diante de uma dificuldade para aumentar receitas no próximo ano. O mercado financeiro não gostou do afrouxamento ainda no segundo ano da existência do novo arcabouço fiscal.
Ainda segundo o blog, o governo poderia ter optado por cortes para atingir esse patamar, mas a equipe econômica acabou avaliando que o clima no Congresso Nacional não é mais favorável a aumento de receitas e, por outro lado, o presidente Lula não quer sacrificar projetos de investimentos.
Também na noite de ontem, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, alertou que mudar a meta fiscal não é o ideal e que a política monetária precisa andar junto à política fiscal. Em outras palavras, indicou que o patamar de juros no final do ciclo de quedas pode ser reavaliado.
Mudar meta fiscal não é o ideal, diz Campos Neto
Fonte: G1