André Janones: o que se sabe sobre acusações de ‘rachadinha’ feitas por ex-assessores contra deputado
Janones nega irregularidades e afirma que o pedido de repasse de valores era apenas uma “sugestão”, que não chegou a ser colocada em prática.
Parlamentares próximos a ele afirmam que as acusações são parte de uma campanha da “extrema-direita” contra o deputado.
Depois que o caso veio à tona, o PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, protocolou um pedido de cassação na Câmara dos Deputados. O suposto esquema de “rachadinha” também estaria sob investigação no Supremo Tribunal Federal (STF), segundo informações da CNN.
Advogado de formação e segundo parlamentar mais votado de Minas Gerais em 2022, Janones começou sua vida política no PT (partido ao qual foi filiado entre 2003 e 2012), passando pelo PSC, até chegar ao Avante.
O político mineiro teve papel importante na campanha à presidência de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022, determinando parte da estratégia do petista nas redes sociais.
A “tropa de choque” de Janones nas redes foi responsável pela propagação de conteúdos contra Bolsonaro, utilizando métodos como um resgate de vídeos com declarações antigas do ex-presidente.
Entenda o que se sabe até agora sobre acusações de ex-assessores ao deputado do Avante.
As acusações
O caso veio a público na segunda-feira (27/11), quando o portal Metrópoles divulgou trechos de um áudio em que Janones teria pedido a assessores que repassassem parte de seus salários a ele.
“Eu pensei de a gente fazer uma vaquinha entre nós, e aí nós vamos decidir se vai ser R$ 50, se vai ser R$ 100, R$ 200, se cada um dá proporcional ao salário. Se cada um der R$ 200 na minha conta, vai ter mais ou menos R$ 200 mil para a gente gastar nessa campanha”, dizia Janones no áudio.
A gravação teria sido feita em 2019, durante o primeiro mandato de Janones como deputado.
Segundo o Metrópoles, os recursos seriam usados para despesas pessoais de Janones, como “casa, carro, poupança e previdência”, e para “reconstruir o patrimônio” do deputado após as eleições de 2016, quando ele disputou a Prefeitura de Ituiutaba (MG) e foi derrotado.
Após a publicação das primeiras denúncias, os ex-assessores Cefas Luiz Paulino e Fabrício Ferreira de Oliveira deram entrevistas aos jornais O Globo e Folha de S. Paulo, reforçando as acusações.
“O primeiro pedido ocorreu em 5 de fevereiro de 2019, assim que ele se elegeu pela primeira vez. Depois disso, todos passaram a repassar um percentual de seus salários em dinheiro vivo, ninguém fazia transferência bancária. Quem ganhava menos também doava, era uma contribuição proporcional, inclusive em cima do 13º salário de cada um”, disse Paulino ao O Globo.
Lotado no gabinete de Janones entre fevereiro de 2019 e dezembro de 2021, Oliveira, por sua vez, afirmou que os servidores eram obrigados também a fazer doações ao Avante, partido do deputado.
Os ex-assessores ainda acusam Janones de assédio moral, divulgando capturas de tela em que o político chama pessoas da equipe de “desgraçados”, “burros” e “incompetentes”, entre outras ofensas.
O que diz Janones
Após a publicação das reportagens, o deputado não negou a veracidade do áudios, mas argumentou não haver irregularidades neles.
“A história: eu (quando ainda não era deputado), disse pra algumas pessoas (que ainda não eram meus assessores) que eles ganhariam um salário maior do que os outros, para que tivessem condições de arcar com dívidas assumidas por eles durante a eleição de 2016. Ao final, a minha sugestão foi vetada pela minha advogada e, por isso, não foi colocada em prática”, escreveu Janones no X (antigo Twitter).
Apesar de o parlamentar afirmar que a conversa teria sido gravada quando ele ainda não era deputado federal, trechos do áudio fariam referência a uma sessão no plenário da Câmara ocorrida no dia anterior à gravação.
Após essa contradição ser apontada, a assessoria do deputado informou que Janones disse não se lembra bem da data em que a conversa ocorreu, segundo a Folha de S. Paulo.
Janones afirmou ainda que a gravação divulgada foi feita de forma “clandestina e criminosa”, que o caso foi espalhado pela extrema-direita e que suas falas foram tiradas de contexto.
“É a segunda vez que trazem esse assunto para tentar me ligar a crimes. Em 2022 já fizeram isso durante a campanha, também com áudios fora de contexto. Essas denúncias vazias nunca se tornaram uma ação penal ou qualquer processo, por não haver materialidade. Não são verdade, e sim escândalos fabricados”, afirmou em nota divulgada no dia 27 de novembro.
A BBC News Brasil encaminhou e-mail ao gabinete de Janones pedindo um posicionamento oficial do deputado com relação às acusações, mas não teve resposta até a publicação desta matéria.
A reportagem também tentou contato com a assessoria de imprensa do deputado por WhatsApp e telefone, sem sucesso.
Investigação no STF e pedido de cassação
Segundo a CNN, o suposto esquema de “rachadinha” é investigado no Supremo Tribunal Federal (STF). As denúncias teriam sido anexadas a uma apuração preliminar que tramita na Corte sob a relatoria do ministro Luiz Fux.
Conforme a emissora, uma investigação foi aberta pela Polícia Federal em Uberlândia (MG) para averiguar o conteúdo de uma denúncia anônima contra Janones e a prefeita de Ituiutaba (MG), Leandra Guedes, ex-assessora dele na Câmara. O caso chegou ao Supremo em maio, enviado pela Justiça Federal de Ituiutaba, por causa do foro privilegiado do deputado.
“A investigação, que está sob sigilo no STF, também mira um suposto esquema de desvio de emendas parlamentares”, informou ainda a CNN.
Na terça-feira (28/11), o PL pediu a cassação de Janones por conta das acusações de rachadinha.
O pedido foi encaminhado à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, a quem cabe encaminhar o caso ao Conselho de Ética da Câmara, que vai deliberar sobre a possível cassação.
Também na terça-feira, a oposição protocolou uma notícia-crime contra Janones junto à Procuradoria-Geral da República (PGR) por improbidade administrativa.
Na denúncia, assinada por mais de 40 deputados, a oposição pede a cassação do parlamentar com base na Lei 8.429/92. Pela regra, se condenado por improbidade, Janones poderia ficar inelegível por oito anos, ter de pagar multa e ficaria impedido de celebrar contratos com o poder público.
Apoios e críticas
Após as denúncias, parlamentares governistas e da oposição se manifestaram sobre o caso.
“A extrema-direita não perdoa @AndreJanonesAdv por sua atuação política”, escreveu Gleisi Hoffmann, deputada federal pelo Paraná e presidente nacional do PT.
“Janones tem todo direito de se defender das acusações lançadas contra ele. Quem tem histórico de rachadinhas, fakenews e desvio de dinheiro público são os que hoje atacam o deputado. Estamos solidários com ele na evidência da verdade”, completou Hoffmann nas redes sociais.
O ex-procurador da Lava Jato e ex-deputado federal Deltan Dallagnol (Novo-PR) publicou um vídeo sobre o tema nas redes.
“Não existe nenhuma justificativa moral, nenhuma justificativa legal para o que ele [Janones] fez”, diz Dallagnol na gravação. “Segundo o nosso Código Penal, isso é crime puro e simples. É roubo de dinheiro público da pior forma.”
“Da mesma forma como a gente viu acontecer nos governos do PT com mensalão e petrolão, o que mostra mais uma vez a hipocrisia da esquerda”, disse o ex-deputado, que teve o mandato cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que entendeu que ele deixou o cargo de procurador para evitar punições em processos administrativos.
Mário Frias, deputado federal (PL-SP) e ex-Secretário Especial de Cultura do governo Bolsonaro, também ironizou o caso nas redes.
“É esse o rachadismo cultural do Janones?”, publicou em sua conta no X.
Quem é André Janones
André Luis Gaspar Janones tem 39 anos de idade. Ele nasceu em Ituiutaba, cidade com aproximadamente 105 mil habitantes a 588 quilômetros de Belo Horizonte. Sua mãe foi empregada doméstica e seu pai era cadeirante.
Conseguiu estudar Direito em uma faculdade particular graças a uma bolsa de estudos para atender famílias em situação de vulnerabilidade. Para se sustentar, trabalhou como cobrador de ônibus.
Sua vida política começou oficialmente em 2003, quando Janones se filiou ao PT. Ele ficou no partido até 2012. Depois do PT, Janones se filiou ao PSC (em 2012) e depois ao Avante.
Sua atuação política era inicialmente restrita ao interior de Minas Gerais.
Como advogado, ele usava suas redes sociais para cobrar o cumprimento de decisões judiciais obrigando o governo e a prefeitura locais a oferecerem tratamentos médicos.
Em 2016, Janones disputou sua primeira eleição. Ele se candidatou à Prefeitura de Ituiutaba, mas ficou em segundo lugar, com 24% dos votos.
Sua carreira política decolou dois anos depois. Usando suas redes sociais, ele se transformou em um dos principais porta-vozes da greve dos caminhoneiros, entre maio e junho de 2018. Na época, as transmissões ao vivo que ele fazia sobre o assunto eram assistidas por milhares de pessoas.
Atualmente, Janones tem mais de 8 milhões de seguidores no Facebook, 2,3 milhões no Instagram, 881 mil no TikTok e 1 milhão no Twitter.
No Facebook, ele tem mais seguidores do que Lula, que tem 5,7 milhões. Bolsonaro, na outra ponta, tem 15 milhões.
Impulsionado por essa popularidade, ele disputou as eleições de 2018 como candidato a deputado federal. Foi o terceiro deputado federal mais votado de Minas Gerais em 2018, com 178 mil votos.
Candidato do Avante à Presidência da República em 2022, Janones desistiu da disputa para apoiar Lula, assumindo parte da estratégia de redes sociais do candidato petista.
Concorrendo a deputado federal, Janones recebeu 238 mil votos nas eleições de 2022, e foi o segundo parlamentar mais votado de Minas Gerais naquele ano.